PRECATÓRIOS: MINISTÉRIO PÚBLICO MOSTRA PROVAS CONTRA ACUSADOS
Por Isaac Lira e Ricardo Araújo
Desde a
inclusão dos nomes dos desembargadores Osvaldo Cruz e Rafael Godeiro na lista de
suspeitos de participação no esquema de fraudes no TJRN a existência ou não de
provas ocupou boa parte das especulações acerca do caso. Ontem, as especulações
foram encerradas. O Ministério Público Estadual apresentou as provas existentes
contra os dois desembargadores e anunciou o pedido de afastamento de ambos
protocolado na Corregedoria do Conselho Nacional de Justiça. A corregedora,
ministra Eliane Calmon, decide em breve se instaura o procedimento
administrativo que apura as denúncias.
Adriano Abreu
MPE apresentou
provas do envolvimento de desembargadores
O pedido de afastamento,
protocolado há duas semanas, está ancorado em provas coletadas ao longo do
processo de investigação do MPE. O procurador geral de Justiça, Manoel Onofre
Neto, disse ontem em entrevista coletiva que o Ministério Público entende como
insustentável a situação de Rafael Godeiro e Osvaldo Cruz, no que diz respeito
ao exercício da magistratura. "O afastamento é necessário porque os
desembargadores estão sob suspeita. Eles foram envolvidos nessas denúncias e por
conta desse envolvimento a atividade judicante, de magistrado, fica
prejudicada", disse o procurador, acrescentando que o MPE possui provas do
envolvimento de Osvaldo Cruz e Rafael Godeiro.
As provas são cheques e
ordens de pagamento, como adiantado pela TRIBUNA DO NORTE na semana passada. Os
promotores exibiram, pela primeira vez, o teor desses documentos. São cheques
nominais em favor de Carla Ubarana, George Leal, Glex Empreendimentos (empresa
de George e dos laranjas do esquema. Essas informações já eram conhecidas.
Contudo, as determinações de pagamento assinadas por Osvaldo Cruz e Rafael
Godeiro emprestam mais contundência às conclusões dos promotores.
Os
documentos disponibilizados pelo MPE não são ofícios e não têm numeração.
Segundo os promotores, foram instrumentos utilizados pela presidência para
transferir valores, e supostamente para pagar precatórios, às contas dos
laranjas do esquema de fraudes. Há transferências para as contas de Carlos
Eduardo Palhares e Carlos Alberto Fasanaro, em valores que oscilam entre R$ 70
mil e R$ 80 mil.
Um detalhe chama a atenção: os instrumentos oficiais de
pagamentos de precatórios utilizados durante o período 2007/2011, quando se
deram os desvios, eram cheques nominais e guias de pagamento. As determinações
de transferências são formas "extra-oficiais", utilizadas unicamente para
pagamento aos laranjas. O promotor do Patrimônio Público, Flávio Pontes,
explicou que não existe registro de precatórios "reais", para pessoas que
realmente tinham o direito de receber o dinheiro, pagos com essas determinações
judiciais. "Esse expediente foi utilizado unicamente para transferências de
recursos para os laranjas", disse.
Com os elementos comprobatórios
encontrados pelo Ministério Público Estadual - que corroboram com as conclusões
do Tribunal de Contas do Estado e da comissão interna do Tribunal de Justiça - a
necessidade de denúncia para o CNJ e o Superior Tribunal de Justiça ficou clara
para o MPE. Além dos pedidos ao CNJ, Manoel Onofre Neto disse ter incluído
sugestões às peças do inquérito criminal enviadas ao STJ de medidas cautelares,
como a quebra de sigilos bancário, fiscal, telefônico e etc. Trata-se do passo
lógico seguinte nas investigações.
Processo pede afastamento de desembargadores
O procurador-geral de Justiça, Manoel Onofre Neto, acompanhado de
dois promotores de Defesa do Patrimônio Público, se dirigiu a Brasília no início
deste mês para protocolar, junto à Procuradoria-Geral da República, as peças do
inquérito relacionadas à investigação na Divisão de Precatórios do Tribunal de
Justiça, que culminou com indícios de envolvimento dos desembargadores Rafael
Godeiro e Osvaldo Cruz.
Como o Ministério Público Estadual não tem
autonomia para investigar magistrados, o processo foi entregue à
subprocuradora-geral da República, Lindora Maria Araújo que, após analisá-lo e
identificar a complexidade e gravidade das denúncias, constatando que existiam
indícios de irregularidades, o encaminhou ao Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Além do Tribunal Superior, a documentação foi entregue pelos promotores, ao
Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
"Nós solicitamos à ministra Eliana
Calmon a abertura de um processo administrativo para aferir a participação dos
magistrados. Além disso, solicitamos o afastamento dos dois desembargadores de
suas funções junto ao Tribunal de Justiça", destacou Manoel Onofre Neto. O
procurador-geral afirmou que existe uma certa urgência em relação ao pedido de
afastamento. O atendimento ao pleito do órgão ministerial potiguar depende, num
primeiro momento, da decisão da ministra Eliana Calmon. Para subsidiar a
deliberação da ministra, os representantes do MPE encaminharam novas provas para
entendimento e comprovação da participação dos desembargadores.
Se a
sentença da ministra Eliana Calmon favorecer o Ministério Público Estadual - com
o deferimento do pedido de abertura de processo administrativo contra Rafael
Godeiro e Osvaldo Cruz - ela confeccionará um relatório acerca do que foi
identificado nos documentos apresentados. Seu parecer deverá ser remetido ao
Colegiado do Conselho Nacional de Justiça para votação do afastamento dos
desembargadores, que também já presidiram o Tribunal de Justiça do Rio Grande do
Norte.
O pedido de afastamento solicitado pelo procurador-geral de
Justiça não tem um período definido. Manoel Onofre Neto afirmou que é preciso
manter a parcialidade nas decisões do Pleno da Corte potiguar, além dos
processos diversos eletronicamente sorteados para os desembargadores
supostamente envolvidos com os desvios de recursos da Divisão dos Precatórios.
"O princípio da parcialidade está comprometido neste momento. Por isso, o
Ministério Público Estadual pediu o afastamento dos desembargadores", explicou o
procurador-geral.
Caso o afastamento das funções adjudicantes dos
magistrados seja aprovado, a Corte potiguar deverá convocar juízes para
substituí-los. Neste ínterim, Osvaldo Cruz e Rafael Godeiro terão 15 dias para
apresentação de suas defesas. Caso sejam afastados, continuarão recebendo
salários. O STJ será ainda responsável pela averiguação do suposto envolvimento
da filha do desembargador Osvaldo Cruz, a advogada Tatianny Cruz. Segundo Carla
Ubarana, ela também seria uma das beneficiadas pelos desvios.
Amarn manifesta apoio à investigação no
Tribunal
A juíza Hadja Rayanne Holanda de Alencar, presidente da
Associação de Magistrados do Rio Grande do Norte (Amarn) publicou nota oficial
na qual manifesta "total e irrestrito apoio às investigações em curso que apuram
as irregularidades encontradas no Setor de Precatórios do Tribunal de Justiça do
Rio Grande do Norte". No documento, a juíza afirma que os magistrados potiguares
estão "perplexos" com os fatos até agora descortinados pela Comissão de
Sindicância da Corte potiguar.
A Amarn ressaltou que "deposita integral
confiança nos trabalhos da Comissão de Investigação, na expectativa de que
seguirão seu curso normal e, ao final, com a serenidade e independência que
caracterizam a conduta de seus membros, concluirá sua missão apontando os
responsáveis pelas irregularidades". Para a Associação dos Magistrados, o
momento de crise pelo qual passa o Tribunal de Justiça atualmente resgatará a
credibilidade do Poder Judiciário, "cuja atuação altaneira é imprescindível à
manutenção do Estado Democrático de Direito".
Além da Amarn, o
desembargador Rafael Godeiro publicou mais uma nota oficial na qual nega,
categoricamente, seu envolvimento com os desvios na Divisão de Precatórios do
Tribunal de Justiça. Na nota, ele se define como um homem que dedicou 43 anos da
sua vida à magistratura e que no dia 10 de abril passado foi "massacrado pelo
vídeo apresentado nas diversas emissoras de televisão, pela imprensa escrita,
blogs e todos os meios de comunicação, no qual a servidora Carla Ubarana de
Araújo Leal" o acusa de coautoria no esquema de desvio de dinheiro público na
época em que foi presidente do Tribunal de Justiça.
O desembargador
afirma que é "vítima de uma atitude torpe, cavilosa e caluniosa na clara
intenção de confundir e aplacar a fúria de uma sociedade que já não aguenta mais
os desmandos e desregramentos das verbas públicas". Para se defender Godeiro
repeliu, "com toda a indignação, as mentiras e calúnias" a ele dirigidas num
depoimento que ele definiu como "articulado, nitidamente traçado dentro de uma
estratégia de defesa".
No documento por ele assinado, ele faz uso de uma
frase que foi anteriormente usada em seu discurso de posse como presidente do TJ
anos atrás. "A Justiça é a rainha e a senhora de todas as virtudes". O
magistrado se diz mergulhado numa situação infeliz que merece ser passada a
limpo. "Se errei foi por confiar demais nas pessoas. Estou pronto a arcar com
minhas responsabilidades e espero que todos os envolvidos com esse triste
episódio sejam punidos por suas ações, omissões, dolo ou culpa". Rafael Godeiro
concluiu sua nota dizendo que acredita "no riso e nas lágrimas como antídotos
contra o ódio e o terror".
Promotor
esclarece investigação
Os promotores de Defesa do Patrimônio
Público, Emanuel Dhayan Bezerra de Almeida e Flávio Pontes, esclareceram alguns
pontos relacionados ao processo investigatório conduzido pelo Ministério
Público. De acordo com eles, os primeiros relatórios recebidos pelo órgão
ministerial apontavam somente a participação de Carla Ubarana, George Leal,
Carlos Alberto Fasanaro, Carlos Eduardo Cabral e Cláudia Sueli
Oliveira.
"Por isso que, no início, nós não poderíamos afirmar que
existia a participação de algum magistrado", comentou Flávio Pontes. Somente com
o aprofundamento nas investigações e nos documentos do Setor de Precatórios,
verificaram-se guias e determinações de pagamentos assinadas pelos
desembargadores.
O promotor Emanuel Dhayan fez uma crítica ao Banco do
Brasil por não ter contribuído efetivamente com o envio de informações
relacionadas à movimentação dos cheques assinados pelos ex-presidentes do TJ e
TEDs feitos por Carla Ubarana em favor dos "laranjas". Em contrapartida, o
acordo da delação premiada e, consequentemente, os depoimentos de Carla Ubarana
e George Leal, corroboraram todos os indícios de irregularidades anteriormente
detectados.
"O depoimento de Carla Ubarana se coaduna com o conteúdo do
inquérito civil", comprovou Emanuel Dayan. O destino do casal Carla Ubarana e
George Leal ainda é incerto. Com o acordo da delação premiada eles poderão
ganhar a liberdade, através do perdão judicial, caso contribuam com as
investigações em curso de uma forma esclarecedora. Tudo, porém, ainda será
analisado pelo MPE.
Judite Nunes não
teria assinado documentos
A conclusão do segundo relatório parcial
do TJRN sobre os desvios no setor de precatórios coincide com o que já divulgou
o Tribunal de Contas do Estado. Segundo o relatório, os desvios aconteceram em
todo o período de 2007 a 2011. Não há menção direta a responsabilidades, mas a
conclusão aponta para a existência de documentos com assinatura dos
ex-presidentes Rafael Godeiro e Osvaldo Cruz.
O item "b" das conclusões
do relatório diz que "vários documentos foram emitidos e assinados pelos
respectivos Presidentes do Tribunal (Osvaldo Soares da Cruz e Rafael Godeiro),
além de outros". No item "c" fica claro que os desvios ocorridos em 2011 (gestão
da desembargadora Judite Nunes) têm documentos emitidos e assinados pela
Secretária Geral e pela Chefe da Divisão de Precatórios.
PRECATÓRIOS: MINISTÉRIO PÚBLICO MOSTRA PROVAS CONTRA ACUSADOS
Reviewed by Erivan Justino
on
sexta-feira, abril 13, 2012
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